segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Sobre leões e gnus (Ética: do ecossistema à razão).


Na minha opinião, a questão mais interessante que surge no momento quando se vai tratar de ética concerne à sua relatividade, um exemplo sintético para elucidar esse fato pode ser observado ao analisar que ética do leão é diferente da ética do gnu. Para o leão é ético comer o gnu, pois se trata da sua sobrevivência, por outro lado o gnu não possui a mesma visão deste processo. Falo aqui de uma ética normativa que se difencia da moral exatamente por tal relatividade que pretendo explorar.
De maneira análoga, a ética das organizações pode se chocar com a das pessoas que a integram. O que é melhor para uma organização nem sempre será o melhor quem está nela, sendo que o inverso também é verdade. Assim, temos um dos maiores dilemas que nortearam – e ainda norteiam – a existência contemporânea, a responsabilidade ética. Ao se tratar de seres irracionais – como o leão e o gnu – é facilmente aceitável a hipótese de que a ética do ecossistema biológico deverá prevalecer sobre os conceitos das espécies. O ato de o leão comer o gnu é um mecanismo de equilíbrio natural que faz parte da vida e garante a perpetuação de todo o ecossistema - isso inclui a perpetuação dos gnus. Nesse sentido, é até possível verificar que, sob a ótica do ecossistema, é bom para o gnu ser comido pelo leão. Entretanto, a ética do ecossistema ainda permite o canibalismo em nome da sobrevivência da espécie. Se algum dia faltarem os gnus, o leão possuirá licença ética para se alimentar de seus pares. Essa afirmação é baseada apenas na lógica ética, talvez não haja embasamento empírico na biologia da espécie.
Por outro lado, o homem – ser racional – há tempos rompeu com a ética do ecossistema. A partir do momento que criou a primeira estrutura, além daquela enviada por “Deus”, alterou significativamente a noção sobre a ética. Até então, somente “Deus” possuía o dom de criar estruturas e, portanto, o ecossistema era sustentável.
Quando o homem se torna racional passa a ter dons divinos, por conseqüência, assume a ética divina, uma ética que lhe permite criar e destruir estruturas pensando unicamente em seu bem-estar ou, para ser mais específico, visando aumentar sua existência. Essa é, portanto, a ética racional. É Independente do ecossistema, pois é estruturadora.
Portanto, as organizações – estruturas criadas pelo homem – são regidas por essa ética racional e isso implica no fato de não poderem assumir uma ética própria. A ética das organizações deve ser a ética do homem, jamais a ética do ecossistema. Caso contrário há um retrocesso evolutivo. Os leões, agora, criam os gnus para não haver em hipótese alguma o canibalismo, pois, entre os deuses, predar um par é antiético. Vale saber que o processo de criar gnus inclui transformar leões em gnus, é aí que residirá o problema fundamental, ou seja, o homem usa seu poder estruturador para transformar ele próprio em estrutura.